Casados à
primeira vista para quem não sabe é um programa de televisão que passa na Sic,
onde pessoas aceitam casar e viver maritalmente durante 8 semanas com alguém
que nunca viram na vida. Supostamente, os pares são selecionados com base na
ciência e algoritmos que dizem que aquelas pessoas são uma boa dupla juntas. As
8 semanas de convívio são para se perceber que desafios enfrentam duas pessoas
casadas e como os ultrapassam. Tudo isto é feito com o acompanhamento de uns
tais de especialistas que analisam as pessoas pra poder usar a tal ciência que
diz que um casal é compatível e que, depois, darão apoio nos tais desafios que
vêm desse convívio. Esta é a premissa. Pessoas que procuram o amor e se apoiam
na ciência para o encontrar.
Todas as semanas
os casais têm uma cerimónia chamada de compromisso, onde falam sobre os
desafios encontrados e se querem ou não continuar a viver a experiência ao lado
da pessoa que a ciência definiu como o seu par ideal. Se as duas pessoas
escolherem terminar, acaba-se o casamento, saem do programa e divorciam-se. Se
apenas uma pessoa escolher terminar e a outra não, o casal têm que continuar a
viver o desafio.
A oitava semana
já não é de convívio, mas sim de reflexão. Os casais separam-se para poderem
decidir se depois de 7 semanas de convívio querem continuar com aquela pessoa
e, neste caso, para assinalar a decisão de ficarem juntos longe das camaras,
renovam os votos.
Neste momento, é
neste ponto que o programa está. Alguns casais já saíram, outros vão decidir se
querem continuar casados.
Já tinha visto a
versão australiana, a neozelandesa (fraquinha) e a espanhola (os espanhóis
partem a loiça toda).
A versão
portuguesa é um bocadinho melhor que a neozelandesa, mas fica muito aquém da
versão australiana. Na versão australiana, por esta altura, das duas uma, ou já
tinha havido drama até dizer chega e já só havia metade dos casais ou os casais
já estavam a discutir qual dos dois se mudava para ficarem juntos. Parece-me
que a coisa por lá é mais intensa, mais levada a sério e com mais conteúdo que
cá, que vemos e revemos a mesma coisa vezes sem conta. Irrita-me quando mostram
imagens do “não perca já a seguir” que afinal era mesmo só aquilo e já está
visto.
Outra coisa que
me faz espécie na versão portuguesa é a quantidade de vezes que se ouve uma
parte dos casais a falar do que pediram. “Eu pedi uma boazona”, “eu pedi que
não fosse um trambolho”, “eu pedi uma pessoa calma”, “eu pedi um homem lavadinho”.
Fico com a sensação que aquelas alminhas pensam que a ciência é isso. Enumera-se
o que se quer, faz-se uma listinha “magro”, “gordo”, “loiro”, “moreno”, “simpático”,
“sério” e a tal da ciência e dos especialistas servem para encontrar uma pessoa
com essas características. A avaliação da personalidade a que os especialistas
os submeteram era só para inglês ver.
Não me espanta,
portanto, que mesmo aqueles que acham que o programa lhes “deu” exatamente o
que “pediram”, não se encontrem satisfeitos. As pessoas são muito mais e muito
mais complexas que uma lista de características. E eu acho que isto, de certa
forma, reflecte um bocadinho aquilo que as pessoas esperam de uma relação mesmo
que esta não seja baseada na ciência, mas sim no acaso, como (quase) todos nós.
Ninguém fala do que pediu porque não há cá nenhuma entidade superior a receber
pedidos e a usar algoritmos, mas fala-se muito do que se queria, do que se
idealizou, do que nos fazia falta. Contra mim falo, que volta e meia, também me
queixo que queria alguém que trabalhasse menos, que ajudasse mais em casa ou
que largasse o telemóvel. Só assim de vez em quando.
Nisto das
relações não há características mais ou menos compatíveis. Há pessoas. Que são
um todo. Que trazem bagagem, ideias, ideais, histórias e estórias. A vida
prega-nos partidas e, às vezes, calham-nos pessoas com aquela qualidade que achávamos
impensáveis para nós, mas que, no final, são muito mais que isso.