Na passada
terça-feira, fui ver a peça de teatro “Conversas Sérias da Marta Gautier – O que
farias se não tivesses medo”, no teatro Villaret. Já tinha visto uma outra peça
da Marta, sempre um monólogo, mas num registo muito diferente, de suposto
humor, por isso, não tinha a mínima ideia ao que ia.
Fiquei sem
perceber bem o que chamar à coisa. Lá em cima chamo-lhe “peça de teatro” por
ser no Villaret e tal, mas a verdade é que não é teatro. Talvez seja uma
plataforma de promoção para os retiros que a mesma organiza, talvez se possa (ou queira)
chamar de palestra motivacional, talvez seja uma espécie de sessão de life
coaching em grupo. Na prática, é um monólogo sobre ela própria e a sua vida.
Diz a mesma que é com o objectivo de influenciar positivamente os outros. Para
mostrar aos que precisem, os seus exemplos e como determinadas mudanças podem
ser melhorias na vida de cada um.
Para quem não
sabe, eu sou uma life coach certificada. Atualmente, não se pode dizer que
exerça e muito menos que receba dinheiro com isso. Faço umas sessões a uma ou
outra pessoa, amigas de amigas ou assim. Mas fiz o curso e já fiz sessões a vários clientes.
Nesse âmbito, concordo com
muitas das coisas que a Marta disse, mas há coisas com as quais não concordo mesmo nada.
Primeiro, a Marta
assume-se com uma pessoa muito zen. E o espetáculo começa de forma zen. Uma
Marta a falar de forma doce, que não quer palmas, que fecha os olhos e inspira
e expira, que se mete pelo meio da audiência, dá-lhe toda uma volta e vai fazendo
festinhas às pessoas sentadas nos lugares nas pontas. Mas depois a Marta começa
a falar e é toda uma ansiedade. Não respira, atropela-se, muda de ideias.
Fiquei com palpitação só de ouvi-la.
Depois, a Marta
falou de muitas alterações que fez na sua vida. A necessidade de estar mais
presente e não se alhear, por exemplo, a ler um livro. A necessidade de
desapego nas conversas que não lhe acrescentam valor. A necessidade de não
estar sempre contatável. Especificamente, a Marta falou do Whatsapp. Os grupos
de Whatsapp, a informação de que a mensagem foi lida e não respondida ou vice-versa
“agora vão ler que eu li, tenho que responder já, ai que ansiedade”. Tenho a
teoria que o que as redes sociais têm de bom, também têm de mau. Também eu
padeço desse mal de ficar ansiosa se não me respondem. Sejam amigos, sejam o
padeiro da esquina. Pergunto-me sempre se devia ter escrito de outra maneira,
se é o tema que não lhes interessa, se sou eu, se são eles. Acho que é daquelas
coisas que se pode aprender a gerir, mas percebo que cada um escolhe as suas
batalhas e esta não é uma da Marta. Também tenho a teoria que ela vê como um
acto de coragem e irreverência esta coisa de não ligar às redes sociais. De alguma
forma intensifica-lhe aquele ar blazé do qual diz querer fugir, mas do qual se
alimenta.
Finalmente, a
Marta fala da sua crença no universo. A Marta acredita que o universo nos dá
aquilo que pedirmos. Compreendo a necessidade de fé. E chamo-lhe fé, no sentido
lato e não religioso, embora, para mim, isto não seja diferente de quem acredita
e pede a Deus. Como life coach, a minha fé é nas pessoas e nas suas próprias capacidades. Acho este discurso perigoso, porque não dá às pessoas ferramentas
para maximizarem o seu potencial, para saberem gerir-se a elas próprias ou
aquilo que a vida lhes reserva. A Marta dá o exemplo da chuva. De pedir ao universo
que não chova durante o tempo em que faz o percurso carro casa (ou outro sítio
qualquer). E conta situações em que não chove porque ela pediu. Não vá o diabo
tecê-las e alguém apanhá-la à chuva, explica que isso acontece quando ela não
se consegue conectar com o universo. Ou quando o universo lhe quer dar uma
lição. Não compreendo como se pode atribuir a uma pessoa a responsabilidade sobre fenómenos da natureza. Ou, a ser verdade que o universo nos dá
o que pedimos, o quão egoísta pode ser tal pedido? E se a chuva fizer falta? E se
do outro lado estiver um agricultor a pedir ao universo que chova? Quem ganha?
Para mim, para se
alcançar a tão desejada paz é muito mais importante a capacidade de aceitar
aquilo que não se controla. É duro, é duríssimo. Não estamos programados para
aceitar a falta de controlo, mas é a maior prova de inteligência emocional, saber redirecionar energia para o que efectivamente está ao nosso alcance.
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